Por: Pedro Antunes
Fonte: Jornal da Tarde
O trajeto de 20 quilômetros percorridos no caminho de casa, na Serra da Cantareira, para o trabalho, na Vila Mariana, na ida ou na volta, pode durar de 30 minutos a duas horas e meia. No aparelho de som do carro, um Peugeot 307 preto, um CD gravado com a discografia dos Beatles está sempre lá. Os amigos até fazem piada com isso. Não é uma situação incomum entre os beatlemaníacos. Mas no caso dele, é sim.
Beto Iannicelli, de 53 anos, passa de 10 a 14 horas por dia trabalhando numa sala sendo obrigado a ouvir o som do quarteto de Liverpool até a exaustão. Ele é professor de música, ou melhor dizendo, professor de Beatles. É, na verdade, um daqueles caras que conseguem juntar o útil ao agradável. Por mais clichê que soe. Mistura o lazer ao trabalho.
Numa sala dentro do Centro de Orientação Musical, decorada com pôsteres e fotos do Fab Four, Beto recebe alunos de música interessados em estudar todo o material produzido pela banda de Paul McCartney, John Lennon, George Harrison e Ringo Star. São mais de 50 beatlemaníacos como ele que, semanalmente, passam uma hora estudando cada detalhe, cada timbre e até cada erro nas gravações dos Beatles. São aulas de guitarra, violão e baixo (que custam R$ 320 por mês) além de opções de curso de voz e arranjos utilizado nas gravações (R$ 340).
“Não posso dizer com 100% de certeza. Mas 99% dos alunos que já passaram por mim eram fã dos Beatles”, explica ele. Afinal, o curso não é para iniciantes. “Não me lembro de ter chegado para alguém dizendo que vamos aprender tal música, e ele não saber qual é.” Para entrar no Complete Beatles Songs – como é chamado o curso – , é preciso ser iniciado em algum instrumento. “Não tenho paciência para ensinar como fazer um acorde básico, pegar o dedo do aluno e colocá-lo no lugar certo. Acho que o jogaria pela escada abaixo (risos)”.
Não passa de uma piada. Beto faz o tipo tranquilo, chama os outros de maneira carinhosa, como “velhinho”, tem cabelo um pouco longo, encaracolado, e mantém o bigode bem aparado, ambos grisalhos. Cobra perfeccionismo, é evidente, mas é algo que qualquer fã exige ao ouvir um cover da sua banda favorita. Com Beto e seus alunos, não seria diferente.
Quatro décadas de mania
O professor garante que ouvir Beatles não cansa. “Eu os escuto desde 1964”, disse. Tinha 7 anos. Com essa idade, conta ele, já pegava um violão e tocava It Won’t Be Long, música do disco With the Beatles, lançado um ano antes. Desde então, ele não parou mais. Tornou-se músico, arranjador, compositor. Há dez anos, cansou de dar aula na Universidade Livre de Música (ULM). “Resolvi fazer o que eu gostava”, explica Iannicelli. A divulgação boca a boca deu conta de começar a encher a agenda de aulas. Atualmente, só existem duas vagas.
Tal fixação também está presente em casa. A família toda, formada pela mulher, três filhas e um filho, herdaram a paixão pelo quarteto. Eles estiveram no show de Paul McCartney em Porto Alegre, no dia 7, e irão hoje e amanhã ao Morumbi. “Ver a reação deles no show é indescritível.” Para ele, será uma curtição. E, para variar, será ao som de Beatles.
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